O ingresso na faculdade foi fácil, mas a verdade foi cruel!
"OBS: esse não é um texto para desmotivá-lo. Se você não for capaz de lê-lo até o final, for muito sensível ou estiver com pensamentos de desistência, feche isso e vá orar."
Infelizmente, existem algumas coisas que não podemos falar diretamente para os alunos hoje em dia.
Com o aumento das vagas para
universidades públicas nos anos de 2010 a 2014, através de financiamentos sem
fiador e sem a necessidade de um histórico de crédito para aprovação, muitos
estudantes ingressaram sem estar necessariamente preparados para essa consagração
e eu fui um deles.
Eu passei no prouni para a
Unicap, mas perdi o prazo. Então financiei o curso pelo FIES.
Mas a verdade é que eu não
estava pronto para entrar em uma faculdade de Direito.
Essa semana, revisitei meu
histórico escolar e percebi quantas notas baixas tive nos primeiros períodos e
quantas vezes fui para as finais nas primeiras disciplinas da faculdade.
A noção de financiamento, apesar
de ser visto por parte do vulgo como bom ou e por outra parte como ruim para a
sociedade, compreendi que aquilo foi algo positivo para mim, especificamente.
Corri atrás de me adequar a
uma exigência extremamente maior do que a faculdade me obrigava.
Quando iniciei a faculdade, eu
trabalhava às vezes 10, 12 horas por dia e, ainda assim, chegava à noite para
assistir às aulas. Isso me deixava extremamente cansado e sonolento, o que
afetou drasticamente meu rendimento acadêmico.
Além disso, venho de uma
formação em escolas públicas.
A impressão que eu tinha
dessas escolas era de que eu era um bom aluno. Porém, essa impressão foi por
água abaixo quando comecei a lidar, pela primeira vez, com textos jurídicos
mais complexos.
Eu simplesmente não entendia
nada.
Cheguei à conclusão de que era
um analfabeto funcional; eu não tinha aprendido nada substancial.
Fatos históricos que eu
julgava ter uma habilidade e conhecimento suficientes estavam apenas pairando
sobre a minha mente, sem o aprofundamento necessário para aplicá-los no
contexto jurídico.
Compreendi que precisava
entrar em uma jornada longa, que necessitava dar alguns passos para trás,
reaprender a ler e interpretar textos, reaprender a escrever, revisitar os
fatos históricos e reler os livros da literatura brasileira e mundial.
Eu só me debruçava sobre eles
para aprender o necessário para responder a uma questão, mas isso era
infinitamente menor do que o conhecimento necessário para alcançar a média dos
alunos de uma faculdade de Direito respeitável.
Assisti a uma sessão de
julgamento no Tribunal Regional Federal da 5ª Região, onde o Des. Federal Paulo
Roberto de Oliveira Lima trouxe algumas palavras que, em suma, levantavam a
questão de que a formação dos advogados hoje é muito mais superficial do que em
seu tempo.
Isso me chamou atenção porque
eu sempre quis fazer essa ponte com profissionais que se formaram e trabalharam
no passado e entender o que poderia fazer para alcançar a qualidade de uma
formação que à época era muito mais difícil e “elitista” do que é hoje.
Ele mencionou que, em sua
época, leu os 61 volumes de Direito Privado de Pontes de Miranda (o maior
jurista da história do Brasil). Eu fiquei pensando: “61 livros? Que formação é
essa?”.
Quando pensamos em um
estudante hoje, em um primeiro momento, temos a imagem de um aluno que “necessita”
do professor, que passa as informações e indica os assuntos a serem revisados
em casa.
Mas aqui, não.
Aqui, o aluno se debruçou
sobre 61 livros que englobam as matérias de Direito Privado, Direito Civil e
Direito Empresarial.
Então, me dei conta de que,
além de não estar capacitado para a compreensão das obras jurídicas
apresentadas na faculdade, eu ainda precisaria me dedicar muito mais às obras
jurídicas que não eram postas na faculdade.
Mais do que nunca, percebi que
não era apenas o meu nível que estava abaixo da formação dos grandes advogados da
história do Brasil, mas também o nível das faculdades estava muito abaixo da
formação deles.
Inclusive as faculdades
federais, cujo alguns alunos eu tive a oportunidade de trocar ideias e
conversar a respeito disso embora eu, particularmente, jamais tenha me
submetido a nenhuma avaliação para ingresso nessas faculdades públicas.
Além disso, eu já estava com
uma certa idade, pois dediquei os anos áureos da minha juventude ao Exército
Brasileiro.
É por isso que o financiamento
público de uma faculdade, como foi o caso da minha e de milhares de estudantes,
não pode ser analisado como virtuoso ou vicioso em si, pois ele não representa
valor isoladamente.
O valor reside na maneira como
o indivíduo reage a esse benefício.
É semelhante a ser filho de
pais ricos: essa condição pode ser virtuosa ou viciosa para um jovem: ele pode
escolher aproveitar os benefícios e as oportunidades proporcionadas por essa
condição ou, como vemos em muitos exemplos negativos, utilizar esses recursos
para uma vida de maldade, sem dedicação, compromisso ou responsabilidade.
O benefício do financiamento
estudantil é similar. É como alguém que empresta uma grande quantia para que
você faça uma faculdade. Agora, se isso vai fazer com que você se torne uma
pessoa melhor, depende exclusivamente de você e não da pessoa que te ajudou financeiramente.
Muitos recebem esse benefício
e, assim como eu, percebem que não estão preparados para a carga científica
exigida em um curso de Direito e acabam desenvolvendo hábitos negativos.
Entre os que me dão maior ojeriza
são aqueles que, ao invés de estudar, começam a buscar formas de passar nas
provas sem realmente aprender, como copiar respostas ou buscar trabalhos extras
genéricos e sem fundamento para ganhar pontos; tudo isso sem enfrentar o
principal desafio: aprender e melhorar culturalmente, cultivando e
esculpindo a própria mente.
Por perceber as dificuldades
de adaptação, estabeleci um plano para me tornar uma pessoa melhor e obter uma
formação de alto nível, apesar das minhas próprias limitações e do nível que uma
faculdade pode exigir dos alunos dentro da legislação atual (crítica).
Qual faculdade hoje exige que
você leia todas as obras completamente, sob pena de reprovação?
Qual instituição exige que
você vá vestido adequadamente para a universidade?
Qual IE, perante um aluno que
acerta todas as questões da prova, retira pontos de sua nota final caso não decida
não produzir nenhum material científico?
Nenhuma, porque nenhuma
faculdade pode exigir do indivíduo que ele cumpra o que deve fazer fora de seus
domínios.
Sempre surgirão desculpas,
como a falta de dinheiro para comprar livros, mas para cada desculpa há uma
solução. Não é o objetivo deste texto abordar todas as soluções, mas se houver
interesse, posso tratar disso em outra ocasião.
O primeiro passo foi perceber
que eu precisava trabalhar menos e ter mais tempo para estudar. Não adiantaria
trabalhar em um lugar que pagasse bem, mas não me deixasse tempo para estudar.
Comecei a buscar estágios e consegui um em um escritório privado e,
posteriormente, na Justiça Federal.
Trabalhando quatro horas por
dia e recebendo um pouco mais do que um salário mínimo, tive a tranquilidade
necessária para me dedicar aos estudos. Apenas receber o incentivo do governo
não é suficiente; a verdadeira formação ocorre fora do curso.
Alguns estarão chateados à
essa altura da leitura (se é que têm disciplina para ler até aqui), pois dirão:
“não vou deixar meu emprego, sou concursado”; “eu tenho família, não posso
arriscar”; ou o meu favorito “você teve sorte”.
Primeiro, eu já estava casado
nesta época. Segundo, esse foi o caso da minha avó que se formou por volta dos
40 anos de idade, concursada em um cargo operacional e com 5 filhos. Ela não
tinha tempo dentro das 8h diárias, então, acordava às 3h da manhã para estudar.
Assim se formou e mudou de vida.
Portanto, foque: não é sobre o
que eu fiz é sobre o que precisa ser feito. A verdadeira formação é feita
fora da sala de aula e você vai ter que achar um jeito de ter tempo para
estudar se quiser fazer alguma coisa que preste nessa área.
Com tempo, minha estratégia
foi ler os livros sobre os assuntos que seriam tratados no próximo semestre.
Lia todas essas obras, mesmo sem compreendê-las totalmente, sem longas pausas
para pesquisa, reflexão ou repetição. Se eu entendesse tudo, ótimo; se não,
também.
A exposição contínua a textos
e obras jurídicas clássicas fez com que, quando as aulas começavam, eu já
estivesse familiarizado com os assuntos. Isso fez com que meu rendimento na
faculdade superasse as exigências que lá me eram impostas.
Qualquer tema de direito ou
norma já era comum para mim. Eu estava na aula apenas para sistematizar o
conhecimento e anotar detalhes específicos que o professor destacava. Isso
transformou um curso que parecia extremamente difícil no início em algo fácil,
e minhas aprovações nas provas ocorreram sem grande esforço.
O método pedagógico mais
antigo do mundo funcionou comigo: um aluno burro e sem tempo para estudar,
arruma tempo, estuda e deixa de ser burro.
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Imagem gerada com o ChatGPT 4º em 02 jul 2024 com o prompt do autor. |
Se eu puder ser mais objetivo sobre os fatores que me ajudaram a transformar um benefício em virtude, e não em vícios, basicamente seria o seguinte:
Primeiro,
procure imediatamente tempo para estudar. Se seu dia está totalmente ocupado e
você só tem tempo para dormir, ou tempo que dedica à sua família ou aos
exercícios físicos, você precisa encontrar tempo para estudar.
Se você está realmente fazendo
um curso para mudar sua vida profissional e sua maneira de ser, qualquer
esforço vale a pena para que você tenha horas de leitura. Não ache que ler
capítulos, resumos ou assistir a vídeos no YouTube vai garantir sua formação
adequada. Você será um fracasso se se dedicar apenas a essas coisas sem ter
tempo para a leitura propriamente dita.
OBS: quem
tem instagram, tiktok, kawaii, jogos on-line e/ou semelhantes no
celular não pode reclamar que não tem tempo para estudar, sem antes deletar
esses aplicativos.
Segundo, uma
vez encontrado tempo para estudar, procure os melhores livros das áreas de
interesse. Eu respeito os livros sazonais no Direito, como manuais, apostilas e
resumos para concursos públicos. Tudo bem utiliza-los se seu objetivo for
sazonal, mas na faculdade, você está se tornando um ser diferente: você está
adquirindo conhecimentos que levará para o resto da vida. Portanto, despreze
livros voltados para concursos.
Leia obras clássicas. Você
está em um ambiente com vários profissionais especializados em todas as áreas
do Direito. Leia entre três e cinco autores de referência sobre um determinado
assunto: vá a uma biblioteca ou livraria, leia um pouco de cada um e escolha
aqueles cuja linguagem você mais compreende. Leia esses autores clássicos para
se qualificar melhor.
Terceiro, não
interrompa sua leitura inicial. Ler é uma coisa, estudar é outra. Deixe para
estudar os textos no momento em que o professor os recomendar em sala de aula.
Esta leitura prévia que estou indicando é uma metodologia para que você esteja
em alta exposição à matéria. Dedique horas de exposição ao assunto sem
interrupções para reler ou pesquisar na internet. Simplesmente leia. O
resultado será que você não verá os assuntos pela primeira vez em sala de aula.
No mínimo, será a segunda vez, e isso coloca você à frente dos colegas que
estão vendo o tema pela primeira vez.
Quarto, faça
resumos das suas aulas ou dos seus estudos. Existem três formas básicas de
resumir: mapas mentais, fichamentos e comentários/esquemas no próprio livro.
Qualquer um desses métodos é válido porque o objetivo é revisar regularmente
suas anotações. Se você está estudando uma matéria na faculdade, revise suas
anotações regularmente para manter o assunto atualizado. Um estudante que
merece ser chamado de acadêmico está sempre pronto para uma prova, pois revisa
suas anotações continuamente. Ele não estuda apenas para as provas, mas mantém
um estudo constante e profundo.
Assim sendo, compreenda que
nenhuma faculdade, hoje em dia, pode exigir o necessário, o mínimo necessário
para você se tornar um profissional qualificado.
Eu afirmo a você: nenhuma
delas pode fazer isso!
Portanto, se você for medíocre
nos seus estudos, se tornará um bacharel idiota e um ilustre desempregado. Mas
se você ouvir essas palavras de sabedoria e adaptá-las à sua realidade, sem vitimização,
o quanto antes e com muita dedicação, você se tornará um profissional
qualificado, que mudará primeiramente a sua vida e a da sua família, mas também
contribuirá para toda a sociedade.
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